O trágico acidente aéreo de 13 de agosto de 2014 que matou o ex-governador Eduardo Campos (PSB) e outras seis pessoas em Santos, no litoral paulista, deixou marcas para além dos familiares e amigos das vítimas. Na política, os efeitos apareceram posteriormente em Pernambuco e no partido de Eduardo, o PSB.
Conhecido por formar alianças com políticos que eram adversários outrora, Eduardo Campos era o líder de um grupo político que comandava o poder em Pernambuco à época. Ele exercia um papel central nas articulações e em tomadas de decisão no PSB, em âmbito nacional e na política de Pernambuco. Em 2014, conseguiu um feito raro em Pernambuco: tinha todos os ex-governadores até então vivos aliados ao PSB. No plano nacional, queria alçar voos maiores, na tentativa de chegar à Presidência da República.
Após a morte de Eduardo Campos, a campanha de Paulo Câmara, nome escolhido pelo ex-governador para a disputa do Governo de Pernambuco em 2014, não tinha mais a presença física do ex-governador, mas as propagandas eleitorais faziam menções a ele. Eleito, Paulo não conseguiu manter por muito tempo a unidade de forças políticas que Eduardo Campos tinha viabilizado.
O núcleo de poder ligado ao PSB fragmentou-se ano a ano, ao ponto de, em 2022, os cinco principais candidatos ao governo estadual terem tido ligações outrora com Eduardo Campos.
A atual governadora Raquel Lyra, por exemplo, deixou o PSB em 2016 por não ter o aval do partido para disputar as eleições para a Prefeitura de Caruaru, no interior do estado.
O PSB também viveu tensões ao longo dos últimos dez anos. Para viabilizar sua candidatura à Presidência, Eduardo Campos trouxe nomes de diversos segmentos ideológicos, como Marina Silva (atual ministra do governo Lula) à esquerda e Tereza Cristina (senadora pelo PP e ex-ministra do governo Jair Bolsonaro) à direita.
Em 2016, o partido apoiou o impeachment de Dilma Rousseff (PT), com minorias da sigla seguindo aliadas à então presidente. Logo em seguida, a primeira cisão foi sobre a participação ou não no governo Michel Temer (MDB).
Daí em diante, a sigla rachou em votações e teve processos de desfiliação e punições por votações de deputados que tinham entrado no partido em 2014 por posicionamentos em projetos no Congresso Nacional diferentes do que foi pregado pela direção partidária.
Mesmo com os rachas, o PSB saiu das urnas em 2018 com 32 deputados federais eleitos, na última eleição para a Câmara dos Deputados sem coligações nas disputas proporcionais. Em 2022, tendo que alçar voo solo, o PSB caiu para apenas 14 deputados, mesma quantidade da federação PSOL/Rede, formada por partidos mais novos na esquerda.
“O futuro do PSB depende muito do lulismo. O PSB não tem muita alternativa, a não ser caminhar com Lula. Se ele romper com o PT nacionalmente, terá um impacto forte em Pernambuco, podendo empurrar o lulismo para apoiar a governadora Raquel Lyra”, avalia o cientista político Adriano Oliveira, da Universidade Federal de Pernambuco.
Apesar da queda, integrantes do PSB classificam o movimento como uma renovação qualificada do partido e dizem que a sigla está mais unida e coesa, mesmo com menos parlamentares. “O partido diminuiu de tamanho, mas acho que aumentou em coesão”, diz o deputado federal Pedro Campos (PSB-PE).
“Quando alguém da dimensão dele vai de forma fulminante, cria-se uma desconformidade. É natural que não tenha ninguém com a capacidade de fazer o que ele fazia e conduzir a frente política que ele fez. E o Brasil entrou em um período de dificuldades”, diz o prefeito do Recife, João Campos (PSB).
No cenário nacional, o PSB faz parte da base aliada do governo Lula (PT). A ligação do PSB com Lula é de longa data e retoma os tempos do ex-governador de Pernambuco Miguel Arraes. Os dois partidos —PT e PSB— estiveram juntos, no primeiro ou no segundo turno, em quase todas as disputas desde a redemocratização, exceto em 2014 e 2018, quando o PSB declarou neutralidade.
A ligação da legenda com o petista se intensificou em 2022, quando foi o principal partido a apoiar Lula e viabilizou a filiação de Geraldo Alckmin, atual vice-presidente.
Eduardo Campos dizia a aliados que Lula era um dos principais responsáveis por sua vitória em 2006. Na época, o presidente apoiou dois candidatos no primeiro turno em Pernambuco, um do PSB e um do PT, Humberto Costa, o que deixou segmentos petistas no estado insatisfeitos.
Nos dois primeiros mandatos, Lula costumava fazer pernoites nos estados durante as visitas, um hábito pouco repetido neste terceiro mandato. No caso de Pernambuco, os jantares na residência ou em hotéis com Eduardo Campos e sua família eram costumeiros nas passagens pelo Recife.
Lula chegou a dizer a ao menos dois líderes do governo Dilma, na semana do impeachment em 2016, acreditar que, se Eduardo Campos estivesse vivo, o PSB não teria apoiado a queda dela.
“Acredito que se ele estivesse vivo seria presidente”, diz Pedro Campos, que classifica como “muito duro” o ciclo de reposicionamentos do PSB nos últimos anos, estando agora mais alinhado à esquerda em âmbito nacional.
Os governos de Eduardo Campos foram marcados em Pernambuco por avanços na área educacional e na segurança pública. Porém, ações do ex-governador geraram polêmicas, como a articulação nacional para emplacar a mãe, Ana Arraes, como ministra do Tribunal de Contas da União.
“Eduardo ainda é muito identificado com esperança de um futuro melhor e capacidade de trabalho nas pesquisas qualitativas. É parecido com Lula, mas Lula é mais ligado ao cuidado com os pobres e o eduardismo à capacidade de trabalho”, avalia Adriano Oliveira.
Em Pernambuco, o principal herdeiro político de Eduardo é o prefeito João Campos. Segundo ele, o pai o estimulava a entrar na política, mas, por vontade de João e da mãe, a opção inicial foi por concluir a graduação em engenharia antes de decidir sobre a possibilidade.
Aliados acreditam que o sonho de João é ser presidente da República e realizar o feito que o pai não conseguiu. Questionado, o prefeito diz: “Ele vai me servir sempre como inspiração, mas nunca me vejo na posição de querer ser mais do que ele ou ser o que ele não foi”.
João Campos conseguiu ser prefeito do Recife, algo que Eduardo não conseguiu em 1992, quando perdeu a disputa municipal. Para 2026, o prefeito é tido como potencial candidato a governador, se for reeleito neste ano, e pode reproduzir, 20 anos depois, a dobradinha entre um Campos e Lula numa campanha eleitoral no estado natal do petista.
Por Matheus Santos – Jornalista da Folha de São Paulo.
Fonte: Blog do Magno Martins.