A Comissão Parlamentar de Inquérito que investigou o setor das apostas online no Brasil terminou seus trabalhos nesta quinta-feira (12) com a rejeição do relatório final, um desfecho inédito em uma década de funcionamento de CPIs no Congresso. Por quatro votos a três, os senadores decidiram não aprovar o parecer apresentado pela relatora Soraya Thronicke (Podemos-MS), encerrando a investigação sob críticas, suspeitas de lobby e denúncias de condutas irregulares.
A votação foi marcada por forte tensão política e manobras de bastidores. Entre os que votaram contra o relatório estão os senadores Angelo Coronel (PSD-BA), Eduardo Gomes (PL-TO), Efraim Filho (União Brasil-PB) e Dorinha Seabra (União Brasil-TO). A favor do parecer votaram Eduardo Girão (Novo-CE), Alessandro Vieira (MDB-SE) e a própria relatora.
Apesar da rejeição, Soraya afirmou que encaminhará os dados coletados durante a CPI ao Ministério Público Federal e a outros órgãos de controle, com o objetivo de dar continuidade às apurações fora do Congresso. O relatório sugeria o indiciamento de 16 pessoas e pedia medidas como a proibição do “jogo do tigrinho” e o reajuste anual da taxa de outorga das casas de apostas.
“A proposta foi feita com base em indícios consistentes. Poderíamos ter apontado mais nomes, mas optamos por agir com responsabilidade diante do material vasto que recebemos ao longo dos 130 dias de trabalho”, declarou a senadora.
A CPI foi criada com o objetivo de investigar os impactos econômicos e sociais do setor de apostas no Brasil, mas rapidamente perdeu força em meio a denúncias de lobby, disputas internas e acusações de tentativa de extorsão. A fase inicial foi marcada por baixa presença dos senadores e forte influência da chamada “bancada das bets”, encabeçada pelo senador Ciro Nogueira (PP-PI), que atuou para blindar os principais grupos do setor.
O próprio Ciro esteve envolvido em polêmica após vir à tona a acusação de que um lobista ligado à relatora teria tentado extorquir empresários do ramo em troca de proteção. O caso gerou um pedido de afastamento por parte de Soraya, mas Ciro rebateu: “Senadora acusada de auxiliar lobista a extorquir investigado não tem credibilidade”, afirmou ao jornal Estadão.
Durante a reunião final, senadores contrários ao relatório chegaram a tentar encerrar a sessão por falta de quórum. Após uma pausa, o senador Alessandro Vieira registrou seu voto, reabrindo o processo. Na sequência, o senador Efraim Filho garantiu a maioria necessária para derrubar o parecer.
A decisão de rejeitar o relatório também foi criticada por setores que esperavam avanços na regulação das apostas. A relatora classificou o resultado como um reflexo da força do lobby das casas de apostas dentro do Senado.
Já o senador Eduardo Gomes, um dos principais críticos da CPI, disse que o modelo atual das comissões parlamentares precisa ser revisto para evitar protagonismos que, segundo ele, transformam CPIs em “espetáculos pirotécnicos”.
“O destino de quem quer ser xerife de CPI tem sido o descrédito. O que se vê muitas vezes é demagogia e ataque à honra, sem consistência nas denúncias”, declarou.
Com o encerramento previsto para esta sexta-feira (14), a CPI não conseguiu renovar seu prazo. O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), não chegou a analisar o pedido de prorrogação feito por Soraya. Mesmo com o fim oficial da comissão, o debate sobre a regulação das apostas no Brasil deve continuar nas próximas sessões legislativas.
*Com informações da Agência AE